Confesso que de inicio senti certa estranheza. Passada a euforia do casamento, da festa, da lua de mel, enfim chegamos em casa; na nossa casa, quando desfizemos as malas caiu a ficha: Eu já não estava sozinha e o assombro foi maior ainda quando me lembrei do que o padre havia dito: até que a morte os separe!
O guarda-roupa mesclava as suas coisas e as minhas, no banheiro as duas escovas de dente, na cama dois travesseiros.
O pior é que eu não estava conseguindo romantizar tudo isso, ao contrario, o espanto me veio como sentimento e em forma de pergunta: o que eu fiz? Uma angustia desesperada que beirava o sufocamento me fez perder o ar dentro do peito, a ponto de me fazer querer sair correndo de casa, peguei as chaves do carro com o intuito de dirigir sem rumo por horas, e pra piorar tudo você reagiu a minha pressa perguntando-me onde eu estava indo(me senti com 15 anos saindo de casa para uma festa pela primeira vez, até isso? Eu tinha mesmo que te dar satisfação?), respondi rapidamente ao supermercado.
_ Vou com você!
_É coisa rápida, não precisa!
Graças a Deus você não insistiu e ficou em casa.
Eu precisava mesmo era fugir, não sei por quanto tempo, mas precisava sair dali porque além da falta de ar começara a tontura, era como se você tivesse tomado todos os meus espaços , estávamos muitos juntos, tudo o que eu tinha não era mais só meu, uma loucura: meu nome havia mudado, meu endereço, nossas correspondências chegariam juntas, a conta no banco conjunta, o telefone da minha casa era o mesmo que o dele, era quase uma crise de identidade, me senti como se já não tivesse vida própria, afinal de contas tudo agora me ligava a ele.
Arrepiava-me pensar nas horas em que não teríamos mais assunto para conversar, e então iríamos comentar a novela, o noticiário, e eu iria enjoar da companhia dele, porque é isso o que acontece comigo: enjoou das pessoas quando elas se tornam repetitivas, enjoou com a rotina, você deixaria de ser criativo, e logo eu estaria entediada ao seu lado, isso me faria sofrer, porque mesmo te amando da forma como sinto te amar, não iria jamais conseguir permanecer ao lado de alguém que se tornou igual as outras pessoas, o que me fez te amar quase que enlouquecidamente a ponto de querer casar com você, era exatamente essa diferença: nos juntos éramos diferentes dos outros casais, e então de repente ficamos iguais com escovas juntas,travesseiros, telefones, contas, jantar depois do trabalho, e sono profundo, sono tedioso, dormir seria meu refugio, mas espera ai: você também iria dormir comigo.
Pensava em tudo isso enquanto dirigia… Por fim para não mentir pra você parei de fato em um supermercado, claro que aquele que ficava do outro lado da cidade, fiquei no estacionamento por algum tempo dentro do carro pensando que talvez fosse normal essas minhas paranóias, medos, neuroses, ou seja, lá que nome isso tenha. Tive vontade de ligar para uma amiga e conversar, pensei em falar com você sobre isso, mas fiquei com medo, afinal nos estávamos desfazendo as malas da lua de mel e eu já estava com a cabeça cheia de coisas.
Por fim resolvi entrar no supermercado, e então me lembrei que ainda dentro do avião você havia me convidado para comer um peixe, acompanhado de um bom vinho, e então quando me dei conta estava fazendo compras para preparar um jantar pra você, na fila do caixa sorri, pois enfim a ficha livre de paranóias caiu novamente: casei com você porque era isso que eu mais queria, essa dependência, essa mistura que a gente se perde e já não sabe onde começa um e termina o outro, casei contigo porque queríamos nos ver todos os dias, e rir das coisas mais idiotas possíveis, e ver televisão juntos, casei com você porque é do seu lado que quero gastar minhas horas de silencio, meus momentos sem assunto, casei com você porque você me faz rir do seu jeito estabanado e calmo, do seu modo de fazer as coisas darem certo quando tem tudo pra dar errado, casei com você porque não consigo enjoar de você, não quero dividir nada, porque com você o “lance” todo é somar…
Voltei pra casa correndo para preparar o nosso jantar, na nossa casa, e ter de sobremesa o nosso amor.
D.S.L