Um dia meu corpo adormecera, sem mais erguer-se diante da vida, em uma outra esfera irei acordar e só então perceberei que tudo o mais o que vive nesta dimensão será deixado pra trás junto a matéria, dela restando apenas lembranças.
Que eu adormeça olhando para o céu, em um dia que esteja lindo de sol, cores, pássaros e melodias, e que em seguida ao despertar esteja diante do cheiro das flores.
Desejo ver um rosto amigo, e ao imaginar este momento espero ter em minhas mãos a mão de um anjo a me auxiliar tocando em mim para levar-me adiante neste novo caminho que se iniciara.
Meu coração tão acelerado durante toda uma vida, creio não mais estará saltitando em meu peito, pois em mim desejo que reste apenas um sentimento: o de paz.
Caminharei sem pressa, com atenção a tudo que apenas em meus olhos hoje consigo visualizar, sorrindo e segura pelo meu anjo estarei consciente de que tudo valeu a pena: o choro, o pranto, o gozo, a vida, e agora esta nova vida como sempre proveniente da morte de algo, neste caso a do corpo.
Não sentirei medo, como senti em todas as outras situações novas que percorreram minha historia.
Espero ser acalentada nos braços daqueles que aqui fizeram parte de mim, o colo de minha avó, o sorriso de minha tia, a saudade contida no choro perante o abraço apertado em todos os outros.
Ilusoriamente, e ainda não digna de tal graça quero olhar-Te nos olhos, a Ti, a Quem muitas coisas foram ditas, a Ti que de joelhos ao chão muitas vezes me fiz suplicar diante da magnitude da possibilidade dos Teus desejos não serem impossíveis
Espero ao menos de longe ver-Te, e se perto permitir-me chegar, beijar teus pés, em agradecimento, Lhe suplicando não mais um milagre, mas sim agradecendo-Te pois tudo terá valido a pena.
Se permitires escutar-me ainda mais uma vez, eu quero contar-Lhe tudo o que senti, quero falar-Te do quão presente senti tuas mãos em mim, do quão constante vi Teus olhos e tuas graças em cada pagina da minha vida, das noites em que me abraçava em silencio, e me fizera adormecer mansamente em sonhos que muitas vezes não faziam sentido.
Agradecer-Te o amor em mim manifestado, a luz que iluminou meus momentos mais escuros, os anjos a quem não colocastes asas e mesmo assim foram capazes de me resguardar das dores da vida.
Pedir-Te perdão, pela pretensão, pela falta de perdão, por tudo o que não soube compreender, aceitar, enxergar, dominar, perdão pelas vezes que não alcancei aquilo que Tu querias que eu fosse. Assim como Jó, “abominar-me em cinza e pó”, quando meus olhos agraciarem a Tua presença enfim real.
Assim, quando Tu me perguntares do que mais gostei da vida, responderei que de Ti, da vida que me deste, e do amor que chegara a mim, amor qual pertenço apenas o sentimento que terei ao conhecer seus olhos.
D.S.L.