Encontrei a felicidade em um moleque que empinava sua pipa, tão simples, os pés descalços, dorso ao vento e aquele pedaço de papel preso por gravetos indo cada vez mais alto, bailando cada vez mais bonito, parecia enfeitar o céu azul, acho que até o próprio sol ficou encantado com essa imagem, a pipa parecia a vida, sem hora pra subir, sem hora para deixar de voar, sabia-se que voava apenas.
Noutra manha a beleza se fez em um ipê amarelinho no caminho de casa, parei meus pés sobre suas flores derramadas ao chão, e ao fechar os olhos pode senti-los, a experiência foi de tanta intimidade que pensei estar descalça, e toda aquela beleza pareceu por alguns instantes fazer parte de mim correndo por minhas veias a pureza daquelas flores.
Quando muito cansada, sem direito de parar, ou fugir para algum lugar onde tudo possa fazer mais sentido, ou ficar mais calmo, sem fumaça, ruído, pessoas nas ruas com frio, crianças sem casa, fome no rosto, na alma, fujo em pensamento para o mar, meu espírito se levanta e caminha sobre a areia branca gelada, não faz frio faz brisa, sem ruído apenas a melodia, sem fumaça o cheiro é de especiarias perfeitas: luar e mar, sem as luzes borradas dos faróis, o encanto e a força daquelas águas parecem lavar meus pensamentos, aniquilando meu desejo de grito.
Assim vão-se as horas até a noite chegar, para que na manha seguinte a pipa volte a enfeitar o céu brincando com menino de dorso nu, os ipês a banhar-se com o brilho do sol, e o cansaço, ah esse é engolido, naufragado pela beleza do mar que ao aniquilar meu grito transforma-o em melodia, resta-me assim sair pela vida a cantar e inventar palavras e historias fantásticas, e pensamentos bonitos, quase bobinhos, pois tomei pra mim a missão de enfeitar a vida.
D.S.L
*imagem: http://bonitoisso.tumblr.com/page/2