O menino brincava de dançar e de cantar, e sendo menino não entendia ao certo porque as brincadeiras tinham que ser sempre as mesmas, queria experimentar subir em arvore, jogar bola, lambuzar o rosto de doce, andar descalço, recusar o banho. Quando tinha pesadelos sentia vontade de correr para o colo de alguém que lhe fizesse adormecer novamente, ao cair não ser repreendido, mas sim acalentado, poder chorar sem que alguém lhe repreendesse por estar sempre no foco de alguma câmera, poder gritar sem que alguém lhe dissesse que isso prejudicaria sua voz; poder ser criança.
Mas o menino precisava crescer príncipe, para mais tarde ser coroado rei.
Como em todo reino seus súditos também lhe foram algozes, e o menino, príncipe, coroado rei, perdeu-se por não saber quem na verdade era, perdeu-se por talvez não ter tido escolha, lhe foi imposto que ele seria rei, e ao querer fazer o que lhe fosse de vontade, seria criticado, caso deixasse o reinado seria tido como louco, assim gradualmente enlouqueceu em seu trono.
Primeiro mudou o cabelo, depois o rosto, e então a cor, não se é admitido, porém ele, o então príncipe, talvez quisesse apenas ficar parecido com os reis que vemos nas historias infantis, o velho estereotipo de cabelos ao vento, rosto delicado e pele alva.
Rei absoluto era aclamado quando subia ao palco, mas longe dali parecia mais uma criança assustada, a criança que ele não pode ser, com medo de tudo, de todos, de si mesmo.
Tivera diversas vezes que se explicar, por diversos motivos, falhas, faltas, opiniões, explicava sobre uma vida que ele parecia não entender. Entendia-se como um personagem de circo hora iluminado e repleto de aplausos, hora obscuro e vaiado.
Ao final do espetáculo, via-se solitário em seu trono.
Era rei e precisava de herdeiros, mas como concebe-los se ainda sentia-se menino, os teve e hoje os pequenos choram por um pai que na verdade era mais um de seus amiguinhos.
Não era homem, não queria ser mulher, não sabia quem era, perdeu-se ao tentar descobrir, pois todos clamavam em uma só voz: és um rei.
E por toda vida carregou em sua cabeça pequena, frágil, cabeça de menino, o peso de uma coroa que lhe feria, enquanto encantava a todos com seu brilho.
Que sua alma de menino enfim esteja em paz!
D.S.L